Medida por medida? O protagonismo judicial, o receio de Beccaria e o processo penal como instrumentalidade constitucional
DOI:
https://doi.org/10.21119/anamps.51.253-275Palavras-chave:
hermenêutica, ativismo judicial, devido processo legal, literatura.Resumo
Tem-se, como objetivo principal, apresentar, a partir da peça shakespeariana e das observações hermenêuticas de Beccaria, a necessidade da reflexão sobre o protagonismo judicial no processo penal. Para tanto, adotou-se uma pesquisa qualitativa, no que diz respeito à abordagem, e também bibliográfica-documental, na medida em que se debruçou sobre artigos científicos e obras doutrinárias, como também documentos legislativos e decisões judiciais, utilizando-se ainda o método dedutivo. Percebeu-se, então, a inegável contribuição da literatura à ciência jurídica, ao passo que possibilita a citada subversão crítica, além de retratar culturas e operar também com a interpretação. Nesse sentido, após a síntese da trama shakespeariana, visualizaram-se dois modelos de juízos, objetivista e subjetivista, o que propicia o debate acerca da função do magistrado no processo penal, como também o fez Beccaria, em Dos delitos e das penas, que descartou qualquer tipo de voluntarismo judicial, atribuindo ao juiz, a execução obediente do texto da lei. Dito isso, constatou-se que, como a leitura constitucional do processo penal é intrínseca à democracia, cabe ao magistrado a construção e manutenção do processo como espaço de efetivação de garantias e direitos do acusado, de modo a ser assim verdadeiro espectador. Enfim, o protagonismo judicial resulta em autêntico descompasso com o sistema acusatório, na medida em que, ao ignorar os limites semânticos do texto legal, salvo em caso de controle de constitucionalidade/convencionalidade ou em favor do réu, realiza vulgar atecnia ou arbítrio, o que prejudica a instrumentalidade constitucional.Downloads
Referências
ABBOUD, G. A democracia constitucional em perigo: os riscos do messianismo judicial e seu falso protagonismo. In: RÊGO, W. Segurança jurídica e protagonismo judicial: desafios em tempos de incertezas – estudos jurídicos em homenagem ao Ministro Carlos Mário da Silva Velloso. Rio de Janeiro: LMJ Mundo Jurídico, 2017. p. 247-260.
AHMED, F. Apontamentos sobre segurança jurídica, estado constitucional e protagonismo judicial. In: RÊGO, W. Segurança jurídica e protagonismo judicial: desafios em tempos de incertezas – estudos jurídicos em homenagem ao Ministro Carlos Mário da Silva Velloso. Rio de Janeiro: LMJ Mundo Jurídico, 2017. p. 215-246.
BARBOSA, Rui. O dever do advogado. São Paulo: HB, 2016.
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.
BOTTINO, T. Protagonismo judicial no processo penal e a audiência de custódia. In: RÊGO, W. Segurança jurídica e protagonismo judicial: desafios em tempos de incertezas – estudos jurídicos em homenagem ao Ministro Carlos Mário da Silva Velloso. Rio de Janeiro: LMJ Mundo Jurídico, 2017. p. 1007-1026.
BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos delitos e das penas. Trad. Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2014.
BETIOLI, Antonio Bento. Introdução ao direito: lições de propedêutica jurídica tridimensional. 12. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2013.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg nos Embargos de Divergência em Resp nº 279.889 – AL. Primeira Seção. Relator: Min. Francisco Peçanha Martins. Data de Julgamento: 27 de agosto de 2003. Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?src=1.1.3&aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&num_registro=200101540593. Acesso em: 5 abr. 2018.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 84.078-7/MG. Relator: Min. Eros Grau. Tribunal Pleno. Data de Julgamento: 09 abr. 2008. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/HC84078voto.pdf. Acesso em: 15 abr. 2018.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 126.292/SP. Relator(a): Min. Teori Zavascki. Tribunal Pleno. Data de Julgamento: 02 set. 2016. Data de Publicação: 07 fev. 2017.
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Audiência de Custódia. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/sistema-carcerario-e-execucao-penal/audiencia-de-custodia. Acesso em: 30 mar. 2019.
CAMUS, Albert. O estrangeiro. 34. ed. Rio de Janeiro: Record, 2012.
CARNELUTTI, Francesco. As misérias do processo penal. 3. ed. Leme: Edijur, 2017.
COMPARATO, F. K. Evandro Lins e Silva: o sentido público da advocacia. In: SILVA, Evandro Lins e. A defesa tem a palavra: o caso Doca Street e algumas lembranças. 4. ed. Rio de Janeiro: Booklink, 2011. p. 15-22.
DELL’ORTO, C. A arte e o ofício de ser juiz. In: RÊGO, W. Segurança jurídica e protagonismo judicial: desafios em tempos de incertezas – estudos jurídicos em homenagem ao Ministro Carlos Mário da Silva Velloso. Rio de Janeiro: LMJ Mundo Jurídico, 2017. p. 115-122.
FLEICHMAN, Gustavo. Justiça divina, Direito e justiça humana: uma resenha sobre “Medida por medida”. In: ALQUÉRES, J. L.; NEVES, J. R. de C. Ele, Shakespeare, visto por nós, os advogados. Rio de Janeiro: Edições de Janeiro, 2017. p. 89-108.
FRANCO, G. H. B.; FARNAM, H. W. Shakespeare e a economia. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.
FRIEDE, Reis. Ciência do direito, norma, interpretação e hermenêutica jurídica. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.
GRAU, Eros Roberto. Por que tenho medo de juízes (a interpretação/aplicação do direito e os princípios). 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2017.
HABERLE, P.; BOFILL, H. L. Um diálogo entre poesia e direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2017.
HELIADORA, Bárbara. Introdução. In: SHAKESPEARE, W. Medida por medida. Trad. Barbara Heliodora. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015. p. 7-9.
IHERING, Rudolf von. A luta pelo direito. Trad. Ivo de Paula. São Paulo: Pilares, 2009.
JARDIM, Afrânio Silva. Direito processual penal. Rio de Janeiro: Forense, 2000.
JARDIM, Afrânio Silva; AMORIM, Pierre Souto Maior Coutinho. Direito processual penal: estudos e pareceres. 14. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: Juspodivm, 2016.
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 9. ed. rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
LOPES JR., Aury. Fundamentos do processo penal: introdução crítica. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2017a.
LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017b.
MASCARO, Alysson Leandro. Filosofia do direito. 5. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2016.
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011.
MEZZAROBA, Orides; MONTEIRO, Cláudia Servilha. Manual de metodologia da pesquisa no direito. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
MONTESQUIEU, Charles de Secondat. O espírito das leis. Trad. Cristina Murachco. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
NASCIMENTO, W. V. do. Lições de história do direito. 15. ed., rev. e aum. Rio de Janeiro: Forense, 2004.
NEVES, José Roberto de Castro. A invenção do direito: as lições de Ésquilo, Sófocles, Eurípedes e Aristófanes. Rio de Janeiro: Edições de Janeiro, 2015.
NEVES, José Roberto de Castro. “Medida por medida”: o direito em Shakespeare. 5. ed. Rio de Janeiro, 2016.
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2014.
OLIVEIRA, Raphael Henrique Figueiredo De. Kafka Penalista: da ficção literária à realidade penal. Anamorphosis - Revista Internacional de Direito e Literatura, v. 3, n. 2, p. 411-435, jul./dez., 2017. Disponível em: http://rdl.org.br/seer/index.php/anamps/article/view/317/pdf. Acesso em: 30 mar. 2019.
PORTO, Mário Moacyr. Estética do direito. Disponível em: https://portal.tce.pb.gov.br/2011/05/estetica-do-direito/. Acesso em: 17 abr. 2018.
RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2015.
ROSA, João Guimarães. Grande sertão: Veredas. 21 ed. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.
SARMENTO, Daniel. O neoconstitucionalismo no Brasil: riscos e possibilidades. 2009. Disponível em: http://www.dsarmento.adv.br/content/3-publicacoes/15-o-neoconstitucionalismo-no-brasil-riscos-e-possibilidades/o-neoconstitucionalismo-no-brasil.riscos-e-possibilidades-daniel-sarmento.pdf. Acesso em: 16 abr. 2018.
SHAKESPEARE, W. Medida por medida. Trad. Barbara Heliodora. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.
SILVA, Danielle Souza de Andrade e. A atuação do juiz no processo penal acusatório: incongruências no sistema brasileiro em decorrência do modelo constitucional de 1988. 2003. 142 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Pós-Graduação em Direito, Universidade Federal de Pernambuco. 2003.
SILVA, Evandro Lins e. A defesa tem a palavra. 3. ed. Rio de Janeiro. Aide, 1991.
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 36. ed. São Paulo: Malheiros, 2013.
SOARES, Ricardo Maurício Freire. Hermenêutica e interpretação jurídica. 2. ed. atual., rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2015.
STRECK, Lenio Luiz; TRINDADE, André Karam. Direito e literatura. São Paulo: Atlas, 2013.
STRECK, Lenio Luiz. Bases para a compreensão da hermenêutica jurídica em tempos de superação do esquema sujeito-objeto. Revista Seqüência, n. 54, p. 29-46, jul. 2007. Disponível em: http://www.egov.ufsc.br:8080/portal/conteudo/bases-para-compreens%C3%A3o-da-hermen%C3%AAutica-jur%C3%ADdica-em-tempos-de-supera%C3%A7%C3%A3o-do-esquema-sujeito-o. Acesso em: 30 mar. 2018.
STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 11. ed. rev., atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2014.
TRINDADE, André Karam; GUBERT, Roberta Magalhães. Direito e literatura: aproximações e perspectivas para se pensar o direito. In: TRINDADE, André Karam; GUBERT, Roberta Magalhães (org.) Direito & literatura: reflexões teóricas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 11-66.
VIEIRA, Oscar Vilhena. Supremocracia. Revista Direito GV, São Paulo, v. 4, n. 2, p. 441-464, jul-dez 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rdgv/v4n2/a05v4n2.pdf. Acesso em: 18 abr. 2018.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Concedo à ANAMORPHOSIS – Revista Internacional de Direito e Literatura o direito de primeira publicação da versão revisada do meu artigo, licenciado sob a Licença Creative Commons Attribution (que permite o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da autoria e publicação inicial nesta revista - https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/).
Afirmo ainda que meu artigo não está sendo submetido a outra publicação e não foi publicado na íntegra em outro periódico e assumo total responsabilidade por sua originalidade, podendo incidir sobre mim eventuais encargos decorrentes de reivindicação, por parte de terceiros, em relação à sua autoria.
Também aceito submeter o trabalho às normas de publicação da ANAMORPHOSIS – Revista Internacional de Direito e Literatura acima explicitadas.